A repercussão dos ataques racistas direcionados ao atacante Vinicius Júnior, do Real Madrid, no duelo com o Valência pelo Campeonato Espanhol no último domingo (21), mostra que este não é um fato isolado. Nos últimos anos, foram vários os casos de racismo contra atletas brasileiros no futebol europeu, dentro e fora de campo, mas que não se limitam ao Velho Continente. Eles também avançaram no Brasil.
Daniel Alves, Taison, Dentinho, Neymar, Roberto Carlos, Malcom, Richarlison, Hulk. Todos eles já foram vítimas de racismo na Europa, de bananas atiradas no gramado a sons que imitam os de um macaco nas arquibancadas. A mesma Espanha na qual Vinicius Júnior tem sofrido com manifestações racistas e de ódio foi palco de boa parte destes ataques.
Confira a linha do tempo:
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“Isso [repetição de ataques a Vinicius Júnior] reflete anos e anos de leniência das autoridades espanholas com o racismo. Especialmente nos campos de futebol, não é apenas Vinícius Júnior que tem sofrido, mas outros jogadores pela Europa também, como o [atacante belga Romelu] Lukaku, vítima de racismo em abril e expulso por reagir contra os xingamentos racistas [na Itália, onde defende a Inter de Milão]. Existe um histórico [de racismo], com mais de 20 anos, com jogadores negros brasileiros e de outros países”, destacou Jorge Santana, professor de História e mestre em Ciências Sociais pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), em depoimento ao programa Stadium, da TV Brasil.
“O Vinícius tem sido uma voz quase isolada na luta contra o racismo no Campeonato Espanhol. As instituições espanholas fazem olhos de mercadores e não tomam atitudes e políticas duras contra o racismo. Das dez denúncias feitas pelo Vinicius [desde 2021], três foram arquivadas pela liga espanhola. Isso faz com que a liga seja uma aliada do racismo na Espanha”, completou Santana, que é autor do livro “Desculpas, meu ídolo Barbosa”.
Brasil
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O racismo no esporte mais popular do mundo, porém, não se limita à Europa. No Brasil, a prática avança de maneira preocupante. Segundo levantamento do Observatório da Discriminação Racial do Futebol, foram registrados 90 casos de ofensas raciais em 2022, contra 64 em 2021. Um aumento de 40%.
Em janeiro deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei 14.532, que tipifica a injúria racial como
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crime de racismo, que já era considerado delito no país, pela Lei 7.716, de 1989. O Regulamento Geral de Competições da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para 2023 indica punição a casos de discriminação, que pode variar de uma advertência até a perda de pontos.
No país, um dos casos mais marcantes ocorreu em 2014, envolvendo o hoje ex-goleiro Aranha. À época no Santos, ele foi alvo de ofensas racistas de torcedores do Grêmio na partida de ida do confronto pelas oitavas de final da Copa do Brasil, na Arena do time gaúcho, em Porto Alegre. Os xingamentos, inicialmente, não constaram na súmula do árbitro Wilton Pereira Sampaio, sendo feito um adendo ao documento, enfim citando a ocorrência. Em decisão inédita, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (SJTD) excluiu o Tricolor do torneio nacional antes mesmo do jogo de volta.
De lá para cá, apesar do aumento dos casos, não houve igual punição. Em agosto de 2021, o Brusque chegou a perder três pontos durante a Série B do Campeonato Brasileiro, por causa de ofensas racistas de um dirigente ao atacante Celsinho, do Londrina, em duelo no Estádio Augusto Bauer, em Brusque (SC). Em novembro, porém, o STJD acabou devolvendo os pontos ao clube de Santa Catarina.
“Na minha opinião, deveria constar no regulamento dos campeonatos que quaisquer manifestações preconceituosas implicariam na perda imediata dos pontos daquela partida, sendo passível de rebaixamento caso se repitam. Já está passando a hora de a Fifa [Federação Internacional de Futebol] se manifestar seriamente. É muito bonito fazer campanha e dizer que todos são iguais no futebol, quando esses casos acontecem tantas e tantas vezes”, analisou o jornalista Cláudio Nogueira, responsável por livros como “Futebol Brasil Memória” e “Esporte: Usina de Sonhos e Milhões”, também ao Stadium.
Em nível continental, a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) ampliou, no ano passado, as punições por racismo em jogos dos torneios que organiza. As alterações foram motivadas por ofensas sequenciais a torcedores e atletas brasileiros em partidas fora de casa durante o primeiro semestre. A multa mínima passou de R$ 150 mil para R$ 500 mil, com possibilidade de o time enquadrado ter de atuar com parte das arquibancadas fechadas ou sem público.
Patrocínios
Se dentro de campo as punições dependem das entidades desportivas, fora dele há o entendimento de que as marcas que cedem os nomes aos clubes e eventos devem pressionar por ações contra o preconceito. Após o caso envolvendo Vinicius Júnior, a organização Sleeping Giants Brasil acionou os 20 patrocinadores da liga espanhola nas redes sociais.
Segundo o diretor executivo da organização, Leonardo Leal, somente dois (Santander e Puma) se manifestaram até a publicação desta reportagem.
“Quando [patrocinadores] associam uma marca ao evento, eles também, querendo ou não, associam-se aos casos de racismo que acabam acontecendo. Como a liga não toma providências, pedimos ajuda desses patrocinadores, que têm muito poder na instituição, inclusive financiam o campeonato, para que deem voz às denúncias de racismo e a liga, finalmente, tome providências. Ficamos aguardando o posicionamento proativo delas no último domingo, dia que aconteceu o caso e o debate tomou as redes. Quando consumimos uma empresa, não consumimos apenas seu produto, mas também a ideia, a visão dessa empresa para o mundo”, declarou Leal à Agência Brasil.
“Acho que uma analogia que cabe muito é em relação às plataformas [redes sociais]. Elas acabam não agindo sobre conteúdos de ódio e desinformação, por isso acionamos os patrocinadores, já que a principal entidade não se move. Com a liga espanhola é o mesmo caso. Isso demonstra que se não for pelo follow the money [siga o dinheiro, na tradução literal do inglês], por pressionar quem financia jogos, campeonatos ou qualquer organização que acabe promovendo discurso racista ou odioso, não vemos muitas escapatórias ou mesmo responsabilizações desses agentes odiosos”, concluiu o diretor da Sleeping Giants.
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